O Império das Horas

O Império das Horas

                                                

Marcha! Um, dois...um dois...
Pés pisoteando com fúria o chão do caminho.
Olha o tempo! ... Olha o tempo!
Acelerado! Acelerado! Marche!
Corre! Corra! Corram!
Os corações parecem dobrarem-se em caimbras,
Os músculos descoordenam-se em movimentos epilépticos,
A suprema obrigação. A ordem a ser cumprida.
Não pense. Não se questione.
Respostas e verdades podem ser heresias.
Tome cuidado com as palavras ditas,
Podem ser a sua confissão de culpa.
Mãos de aço podem adornar-lhe a garganta.
Vamos! Andem! Vamos, molengas!
Estão todos atrasados. São todos uns perdedores.
Temos que vencer, mas estamos atrasados.
Temos que chegar no horário, mas somos perdedores.
Aqueçam os músculos, esfriem a alma.
Sonhos são inúteis, sejam práticos,
Sejam heroicamente tolos,
Finjam-se de ingênuos como estratégia de esperteza.
Transformem em dinheiro a sua criatividade.
Enredem-se no novelo de comprar e vender.
Todo o saber por uns míseros trocados.
Entretanto, por um instante, parem!
Segurem estes malditos segundos.
Esmurrem essa boca que não para de emitir ordens.
Depois, caia de joelhos e peça clemência.
Com lágrimas nos olhos, engula alimentos e líquidos.
Fique muito feliz por tê-los, pois a miséria é terrível.
Teme a falta de recursos, não reclame do desprezo,
Agradeça a tudo, agradeça a todos.
Se não quiser agradecer, ao menos finja.
Premie com sua hipocrisia o orgulho alheio,
Para depois receber em troca toda merecida indiferença.
Não se esqueça de bater continência às estátuas das praças.
Plante um sorriso imbecil na sua face, seja aceitável.
Seja tolerável, tente agradar, não julgue a nada.
Esqueça as suas inquietantes dúvidas
E por fim, nada de lágrimas,
Escancare os dentes e sorria.