Meu especial amigo Abel,
Muito me honra estar com a Rosângela na foto junto a esta sua profunda poesia, que firma uma clara narrativa de preocupações existenciais e porque não metafísicas. Mas esse tempo, escasso ou abundante, é um recurso provido simetricamente com a coragem de nossas escolhas, que invariavelmente dependem de quando e como esse tempo nos permite escolher, ou seja, é um "trade off" do qual você não pode levar os dois, e que portanto não dá espaço para sentimentos de remorso, arrependimento ou mesmo traição.
Filosoficamente apelo à famosa afirmação de Jean Paul Sartre: “O homem está condenado a ser livre”. A razão por trás desta declaração reside no fato que liberdade implica em escolha e esta por sua vez, traz consigo algum tipo de tomada de decisão.
Recorrendo ainda ao romance Grande Sertão: Veredas de João Guimarães Rosa que, pela narrativa de Riobaldo, seguimos um caminho de muitas reflexões sobre sua própria vida, a vida de um sertanejo, ex-jagunço, que pode muito bem ser a reflexão sobre a vida no comum, de pessoas reais e de suas relações com a angústia e com o sofrimento,
É esse imaginário de vida e de fé que fazem com que façamos uma reflexão para além da literatura, uma obra que quer, como objetivo central, tentar “rodear e devassar um pouquinho o mistério cósmico, esta coisa movente, impossível, perturbante, rebelde a qualquer lógica, que é chamada “realidade”, que é a gente mesmo, o mundo, a vida”
Vamos então à narrativa:
"Sempre sei, realmente. Só o que eu quis, todo o tempo, o que eu pelejei para achar, era uma só coisa - a inteira - cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive. A que era: que existe uma receita, a norma dum caminho certo, estreito, de cada uma pessoa viver - e essa pauta cada um tem - mas a gente mesmo, no comum, não sabe encontrar; como é que sozinho, por si, alguém ia poder encontrar e saber? Mas, esse norteado, tem. Tem que ter. Se não, a vida de todos ficava sendo sempre o confuso dessa doideira que é. E que: para cada dia, e cada hora, só uma ação possível da gente é que consegue ser a certa. Aquilo está no encoberto: mas, fora dessa conseqüência, tudo o que eu fizer, o que o senhor fizer, o que o beltrano fizer, o que todo-o-mundo fizer, ou deixar de fazer, fica sendo falso, e é o errado. Ah, porque aquela outra é a lei, escondida e vivível mas não achável, do verdadeiro viver: que para cada pessoa, sua continuação, já foi projetada, como o que se põe, em teatro, para cada representador - sua parte, que antes já foi inventada, num papel...".
Enfim, enfrentar com coragem a virgindade das conseqüências de nossas escolhas que virão é o maior desafio daquele que busca sua liberdade em vida.
Grande abraço do amigo,
Edye