MEU TEMPO DE INFÂNCIA

Eu nasci naquela serra, que se vê lá bem distante
Num rancho beirando o chão onde havia arvoredos
E a passarada cantava nos fazendo saudação
Araras, papagaios, graúnas, curiós e sabiás
Era bela aquela orquestra, dos músicos lá do sertão
Grasnavam em festa de um galho a outro a pular
Eu amava aquelas aves com grande adoração.
 
Foi lá meu berço sagrado, de nada posso esquecer
Sou filho daquele prado, de campos muito relvados
Com flores coloridas pequeninas e cheirosas
Eu as colhia brincando, formando um lindo buquê
Nos jarros do nosso altar com prazer as colocava
Para agradar minha mãe, depois ia me esconder
Ela logo me encontrava e fingia não me ver.
 
Ai tempo que passou rápido e que não volta jamais!
A gente cresce e tudo muda, a alegria se vai...
Chega a vida de adulto, que só deveres nos traz
Fui morar na cidade, eu tinha que estudar
Foi grande a minha saudade, de tudo que deixei lá
Às vezes ainda ouço aquele bendito grito
De minha mãe chamando: Vem pra casa Expedito!
 
Fingia que não estava para lhe dar mais cuidado
Nas moitas me escondia e só ouvia sua voz
Hoje sinto saudades, até de suas palmadas
Que quando com teimosia, eu não lhe obedecia
E ela meio zangada ao chão me ajoelhava
Quando eu a via sair, logo me levantava
E quando ouvia seus passos, ao castigo voltava.
 
Que tempo bom que passou e não volta mais
Ficaram apenas lembranças, dos verdes canaviais
Que no terreiro à noitinha suas canas eu chupava
Lá tinha muita fruta, nas árvores eu me trepava
As colhia com as mãos e todas devorava
Depois corria ao riacho e nas águas mergulhava
Que vida boa eu tinha, em nada de mal pensava!
 
Era bem descontraído passava o dia a pescar
A noite quando chegava, com meu primo ia jogar
Tinha um balanço armado no galho de uma jaqueira
Meus vizinhos e colegas balançavam a tarde inteira
As castanhas de caju secava-se pra torrar
As palmeiras eram nativas, muito coco lá havia
Montava no pangaré e atrás do gado corria
 
Caí até muitas vezes, em vez de chorar sorria
Quando chegava ferido de minha mãe escondia
Ela sempre me falava, meu filho tenha cuidado
Não monte nos potros bravos, que você pode cair
Eu fingia obedecer, mais fazia o que queria
Era um menino danado, pela vida apaixonado
Tudo fazia escondido, minha mãe não percebia
 
De vez em quando brigava e dos outros apanhava
Toda espécie de arranhões e muitas marcas ficavam
Como era de costume nem pra ela me queixava
Hoje que já a perdi, só guardo recordação
Tudo me traz saudade e me punge o coração
Até lá minha mãezinha, guarde pra mim um lugar
Peça ao papai do céu com sua fé e contrição
 
Do mesmo jeito e respeito, que me ensinou a orar
Fique bem perto de mim, nas horas de aflição
Livre-me de todo perigo, segure a minha mão
Aqui eu ando perdido, não tenho consolação
De minha mente não sai, a santa recordação
Quando sentava ao seu lado, no sofá do casarão
Que linda me aconchegavas bem perto do coração
 
E dizia: meu filho vai te deitar e reze tua oração!
Peça ao nosso amado mestre, que nos dê a salvação
Se eu for na frente, te juro, guardarei o teu lugar
Amar-te-ei para sempre, nunca vou te abandonar
Amor de mãe é sagrado, ninguém o pode igualar
Desde que nasceu Maria a santa mãe de Jesus
Que ensinou-nos a pedir Sua benção e Sua luz
 
Não há na terra outro amor que se possa comparar
Com o santo amor de mãe que é puro e sagrado
Nas suas entranhas seus filhos foram formados
Elas dão por nós a vida se um dia preciso for
Até nos animais selvagens, existe este grande amor
Ele é incomparável, sincero, santo e bendito
Ficou comigo o seu eco: Vem pra casa Expedito!

 

MARIA AGLAIDE NEVES
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